quinta-feira, 31 de março de 2011

ESTA MANHÃ UM PÁSSARO



(para um pequenino pássaro verde e azul que morrendo hoje pela manhã após bater na vidraça/
mostrou a tristeza de uma janela fechada)



Esta manhã um pássaro filho do arco-íris bateu
na vidraça
da minha janela fechada
e morrendo caiu ao solo
Os sonhos como os pássaros
tem asas e voam
morrem quando encontram janelas fechadas e caem ao chão...
Janelas fechadas matam pássaros

sábado, 5 de março de 2011

DIE WALKÜREN/As Valkírias Um Rescaldo







(Memoriais de Sofia/Zocha)



Parece que nem toda fachada revela o rosto, palavras ressoam nas asas do tempo e a ave do tempo singra passagens, passaradas vias .. Aquela fachada antiga e alquebrada da casa bombardeada do Pilarzinho ocultava sob um rosto recortado de heras, entremeados veios sulcados de angústias. Era uma casa de sinistros porões e temerosas cumieiras. Havia nela muitas escadas ocultas sob as visíveis que se apresentavam ao mundo. E aquele rosto erigido no topo daquela colina ilhada talvez outrora fosse o único farol sob um mar de araucárias.O tempo que por ela agora passava com suas náufragas carnes ia moldando seus novos personagens e suas ressonâncias. Era um tempo de floradas de pereiras e palmeiras de butiás a contrapor-se à visceralidade do seu sorriso de angústia, mesmo assim ela contemplava o horizonte com seus janelões altos, qual crateras imensas por onde os olhos do tempo miravam destinos. Assim, separecia haver emergido de um rescaldo após um bombardeio , a velha casa ainda guardava na cumeira seu aconchego para o morcegos enquanto das escadarias gastas com seus beirais de lábios mordidos recendia o gosto de sal que escorria das lágrimas das paredes úmidas. Um rosto alquebrado de estórias que olhava com melancolia o horizonte e deixava-se florescer em ninhos pelos sulcos alquebrados. Ah, ali os pássaros realmente, faziam a confraria. Zocha sentada no beiral da porta da cozinha, com os pés no hall desgastado que dava para uma carcomida escada, aos fundos,escrevia algumas linhas . Sob o beiral descarnado da escadaria, avistava-se as paredes descamadas, de outra construção , escombros do que outrora parecia haver sido um grande abrigo para os serviços domésticos. As parasitas lambendo as paredes, a solidão dessas muralhas carcomidas , nelas o sol desenhava viscosas sombras como um trompe l’oeil que lembrava as antigas casas romanas. Mas o rosto desta vila era bárbaro e outrora denotava haver sido uma altiva mulher nórdica, ainda guardava os vincos da antiga beleza e os sinais dos sabres e armaduras empunhados nas paredes rasgadas, talvez resquicios de sua árvore secreta ao centro de suas ambiguidades... Zocha olhou em volta, Pesavam-lhe aos sonhos naquele caderno espiral em que escrevia, da pauta podia ouvir Die Walküren de Wagner, o corpo de sua casa pesava, um terrível peso naquele vazio preenchia a enorme sala vazia, onde só dormitavam singelas polronas de pés ponteaguados. O recital seria no dia seguinte ...


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